Tive a grata oportunidade de trabalhar em uma empresa onde dois colaboradores eram pessoas com deficiência visual. Aliás, é válido um parênteses aqui: observado da perspectiva da inclusão social e pela Convenção Internacional para Proteção e Promoção dos Direitos e Dignidade das Pessoas com Deficiência, o termo correto a ser utilizado é “pessoa com deficiência”. A utilização das terminologias “deficientes”, “excepcionais”, “pessoas com necessidades especiais”, “pessoas portadoras de deficiência”, “pessoas portadoras de necessidades especiais” são inadequadas nos dias atuais.
Por trabalhar com e-learning, observava o esforço que estes colegas tinham para ter acesso às informações. Seja por braile ou pelos sintetizadores de voz no computador, me impressionava a postura ativa que estes colegas de trabalho possuíam para buscar as informações de seu interesse. Um deles, diga-se de passagem, atuava como DJ, o que me deixava ainda mais impressionado! Este convívio motivou-me a abordar no trabalho de conclusão de curso da pós-graduação o tema da aprendizagem virtual para pessoas com deficiência visual. Eu desejava entender se as organizações que implementavam programas de educação corporativa, sobretudo, por meio do e-learning, preocupavam-se com a questão da acessibilidade.
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Na ocasião, contando com um site que disponibilizava pesquisas e enquetes pela internet, convidei as pessoas a refletirem sobre este tema. Dentre os vários quesitos propostos nesta pesquisa, me chamou a atenção o fato de mais de 80% das organizações pesquisadas não terem desenvolvido cursos online considerando a acessibilidade para pessoas com deficiência.
Durante quatro anos consecutivos (2006 a 2009) esta pesquisa continuou sendo apresentada por este site. Neste intervalo de tempo, este gap diminuiu para 70%, demonstrando que algumas organizações tomaram providências quanto a inclusão social das pessoas com deficiência.
Da mesma forma que um arquiteto se preocupa com a questão da acessibilidade ao projetar edifícios ou residências, acredito que no âmbito da educação corporativa, esta preocupação deve permear todos os setores, desde o profissional que realiza o design educacional do curso, o web designer que produzirá as telas interativas até o profissional que implementará o curso no ambiente virtual de ensino-aprendizagem. Sobretudo, penso que os clientes que demandam o desenvolvimento de cursos online também precisam questionar se os seus fornecedores podem e estão aptos para atender esse nicho de desenvolvimento.
Recentemente, a SOU, empresa de serviços voltada ao desenvolvimento de pessoas, apresentou uma proposta pedagógica para uma instituição que possui o compromisso de bem-estar e inclusão social. Nesta proposta foi considerado que o desenvolvimento dos cursos online deveriam atender às pessoas com deficiência, o que impactaria na forma de produzir os cursos e nas tecnologias que deveriam ser empregadas, tais como a adoção de procedimentos de acessibilidade referenciados pelo Web Content Accessibility Guidelines (também conhecido por WCAG 2.0).
Dessa forma, gostaria de propor quatro ações que as instituições interessadas em promover a inclusão social, digital e capacitação profissional de pessoas com deficiência (visual, auditiva ou motora) podem adotar para incorporar nas suas estratégias de educação corporativa e e-learning:
Acreditar nas habilidades das pessoas com deficiência: mesmo com as diversas barreiras tecnológicas, muitas pessoas com deficiência dispõem de grande habilidade e disposição para realizar cursos online. Em uma entrevista realizada com um aluno de um curso a distância com deficiência visual, ele relatou que o ambiente de aprendizagem não havia sido preparado para ele, mas mesmo com os problemas deste ambiente, ele alcançava sucesso devido a sua experiência com leitores de tela e também do auxílio, em alguns momentos, das pessoas que enxergam.
Sensibilizar as pessoas da organização: demonstrar a importância de desenvolver cursos para pessoas com deficiência é um dos primeiros passos para seguir neste sentido. Certa vez, convidei um consultor em acessibilidade (ele é uma pessoa com deficiência visual) para expor aos profissionais da empresa (programador, web designer e designer educacional) suas impressões acerca da acessibilidade na educação a distância. O programador que participou desta reunião mostrou-se sensibilizado ao assistir o depoimento desse consultor, que comemorou ter concluído a sua graduação por uma instituição de ensino a distância.
Conhecer e incorporar tecnologias de acessibilidade na organização: existem softwares, tanto pagos quanto livres, que se dispõe a facilitar o acesso das pessoas com alguma deficiência. Um exemplo disso é o JAWS®, um software sintetizador de voz (também conhecido por “leitor de tela”) que apoia a pessoa com deficiência visual no acesso ao sistema operacional, ferramentas de produtividade e internet. Importante ressaltar que o sistema operacional Windows e também o Mac OS possuem recursos de acessibilidade nativos (basta buscar em preferências ou configurações pelo termo “acessibilidade”). O mesmo se aplica a recursos mobile, como tablets e smartphones Android ou iOS: habilitando os recursos nativos de acessibilidade, as pessoas com deficiência podem acessar e gerar informações.
Desenvolver conteúdo com base nas referências de acessibilidade do WCAG 2.0: designers educacionais, webdesigners e programadores precisam ter noções e técnicas para aplicar as diretrizes de acessibilidade para web do Web Content Accessibility Guidelines. O WCAG.2 pode ser utilizado pelas organizações como uma “lista de verificação” de acessibilidade para web.
Estas diretrizes destacam, por exemplo, que qualquer conteúdo não textual (como imagem e vídeo) deve oferecer uma alternativa em texto para que ela possa ser acessível, além de diretrizes de adaptabilidade do conteúdo, navegação e legibilidade.
Com essas ações, as instituições corporativas podem contribuir com a profissionalização, dignidade e inclusão social das pessoas com deficiência. Que tal fazer a sua parte? |