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Uma chance para brilhar

Preconceito, despreparo de colegas e de chefes, falta de adaptação do ambiente de trabalho, dificuldades de aprendizagem e de comunicação são algumas barreiras que pessoas com deficiência intelectual enfrentam para trabalhar. Esses profissionais costumam ingressar no mercado graças à Lei de Cotas, que estabelece a obrigatoriedade da contratação de pessoas com deficiência por empresas particulares com 100 funcionários ou mais - o percentual varia entre 2% e 5%, de acordo com o quadro de empregados. O desempenho é habitualmente bem avaliado por empregadores, mesmo assim, das 2,6 milhões de pessoas com esse tipo de deficiência no Brasil, apenas 21 mil contam com um emprego formal.

No Distrito Federal, há 28 mil pessoas com deficiência intelectual, e pouco mais de 5 mil trabalham. Em comparação com outros tipos de limitação, elas recebem os menores salários. A quantidade de contratações só fica atrás do número de profissionais com deficiência múltipla.

Segundo Sinival Neris Pinheiro, consultor de emprego apoiado da Associação Brasileira de Assistência e Desenvolvimento Social (Abads), a maior dificuldade está em conseguir o trabalho, e não em realizá-lo de maneira satisfatória. Ele defende uma maior receptividade por parte dos empregadores. "As empresas precisam abrir as portas. Trabalhar com alguém assim pode parecer muito diferente, mas é só pela falta de costume", opina.

A relação profissional traz vantagens tanto para contratados quanto para contratantes. Os primeiros se sentem incluídos e passam a ter poder de compra. Para as empresas, os benefícios estão na qualidade dos serviços prestados e na construção de um ambiente colaborativo. "Eles são subestimados, mas provam ter competência. Por outro lado, a equipe aprende a lidar com diferenças, o que torna a empresa melhor", garante a professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB) Amaralina Miranda.

As dificuldades no convívio se devem à falta de conhecimento. Essa é a opinião de Adriana Lotti, coordenadora do serviço de inserção e acompanhamento profissional da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae). "Às vezes, há problemas porque a equipe não sabe lidar com aquela pessoa e tem medo. A pessoa com deficiência está ali porque tem condições de exercer a função, e deve ser tratada como qualquer outra, com respeito às limitações dela."

RELAÇÃO DURADOURA
No Distrito Federal, a permanência em um emprego por até um ano é mais frequente entre as pessoas sem deficiência. Após esse período, a situação se inverte. A partir desses dados, um estudo realizado pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), divulgado em maio de 2013, presume que, ultrapassadas as barreiras iniciais, a permanência desses profissionais no emprego formal é duradoura. Adriana Lotti, da Apae, comprova os resultados. "Acompanho 236 pessoas com deficiência intelectual em 62 empresas. Há funcionários com 10 anos de casa", comenta.

As cotas para pessoas com deficiência não são totalmente eficazes. Essa é a constatação de Antônio José Ferreira, secretário nacional da Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência. "Há 700 mil vagas abertas a serem preenchidas para cumprir a lei. No entanto, empresários preferem pagar multa a contratar", denuncia. Ferreira acredita que um problema é a confusão com transtornos mentais. "As duas coisas não têm relação: deficiência não é doença. É preciso que haja adaptação no ambiente de trabalho. No caso da pessoa com deficiência intelectual, isso consiste na conscientização de todos. O preconceito no Brasil é camuflado e atrapalha a inserção profissional dessas pessoas", explica.

Os salários de funcionários com deficiência intelectual tendem a aumentar de acordo com o grau de instrução. O rendimento médio mensal de um analfabeto é R$ 806,09, enquanto a remuneração para quem tem nível superior chega a R$ 2.684,44. No entanto, mais de 80% das pessoas com deficiência intelectual não concluíram nem o Ensino Fundamental. O Censo da Educação Superior de 2012 apontou que havia 549 pessoas com deficiência intelectual matriculadas em cursos de graduação em todo o país. Em Brasília, eram apenas 61.

Cursar uma graduação pode ser um desafio, mas não é impossível. Jéssica Mendes de Figueiredo, 21 anos, é uma das 23 pessoas com síndrome de Down com nível superior no Brasil.

Formada em fotografia, ela sonha em ser empresária. "Quero criar uma empresa de fotografia de moda. Penso em me aprimorar na área de fotografia e depois entrar numa faculdade de moda também", planeja. A jovem acumula experiências em trabalhos voluntários como fotógrafa.

A presidente da Federação Brasileira das Associações de síndrome de Down, Gecy Klauck, destaca que a educação ajuda os profissionais. "Eles estão sendo mais capacitados e surpreendem pelo bom desempenho. Tarefa dada é tarefa cumprida."


DEFINIÇÃO
A Associação Americana sobre Deficiência Intelectual e do Desenvolvimento (AAIDD, na sigla em inglês) e o Decreto nº 5.296, de 2004, definem deficiência intelectual como funcionamento cognitivo significativamente inferior à média, com manifestação antes dos 18 anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, como comunicação, habilidades sociais, lazer e trabalho. Alterações genéticas, como as síndromes de Down, do X-Frágil e de Prader-Willi, e os erros inatos de metabolismo, que são identificados pelo teste do pezinho, enquadram-se nesse tipo de deficiência. A deficiência intelectual não é causada apenas por alterações genéticas: tem causas multifatoriais, às vezes até desconhecidas, que podem ocorrer antes, durante e depois da gestação.


ESPECIALISTAS EM BIBLIOTECAS
Em 2006, a Apae passou a treinar pessoas com deficiência intelectual na Biblioteca da UnB para atuarem na conservação de livros em órgãos públicos. Desde que a equipe chegou à Biblioteca do Ministério das Relações Exteriores, em 2011, não houve mais infestação de fungos nos mais de 170 volumes. "Eles se concentram por horas e realizam a função melhor do que as pessoas sem deficiência", avalia Madalena Ribeiro, coordenadora do local. Welington Silva, 24 anos, de Planaltina, se sente realizado. "O treinamento me ajudou a conseguir o primeiro emprego quando minha família estava sem esperanças", diz. Naianny Pereira, 24, comemora: "A deficiência não me atrapalha no trabalho e recebo muitos elogios".


DEZ ANOS DE INCLUSÃO
No Superior Tribunal de Justiça (STJ), a primeira contratação de um funcionário com síndrome de Down ocorreu em 2004. Hoje, são 11 pessoas atuando em diferentes áreas. Querido por diversos funcionários, o grupo bate ponto, justifica faltas e demonstra responsabilidade. Clécia Alexandra Macedo, 37 anos, atuou por 12 anos numa creche e, atualmente, trabalha como secretária num gabinete do STJ. "Adoro trabalhar aqui e me saio muito bem. Minha mãe tinha medo de me deixar trabalhar, mas hoje sou independente", conta. Jorge Abreu El Kadi, 37, estudou até o 3º ano do ensino médio e trabalha contente durante as seis horas diárias. "Trabalhar faz bem para a minha cabeça. Aqui, tenho amigos de longa data", constata.


TRABALHO ESTÁVEL
O quadro de 540 funcionários do Home Hospital é composto por seis pessoas com deficiência intelectual. Rebeca Lustosa, 22 anos, conseguiu ali o primeiro emprego como assistente administrativa. O salário mínimo recebido pela jornada de 40 horas é motivo de comemoração. "É bom ter meu próprio dinheiro. As empresas precisam abrir as portas para ver aquilo que somos capazes de fazer", afirma. Já Paulo Alves, 23, está no hospital há três anos. "Gosto muito daqui, mas quero cursar educação física para ter uma vida melhor", conta. A gerente de RH Kenia Afonso é só elogios para a equipe. "Eles são comprometidos, não faltam nem se atrasam, interagem com o resto do pessoal. Não há rotatividade, quem entra costuma ficar."

 
FONTE: Portal Linear Topo ↑
 
 
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